sábado, 8 de março de 2014

Dia Internacional da Mulher Invisível



Mais um 8 de março e ainda há poucas pessoas escutando a voz do nosso feminismo.
Sim, nosso. Porque o feminismo não é só um, são vários.
O feminismo que vale para a mulher que trabalha fora, não é o mesmo que vale para a mulher dona de casa. O feminismo da mulher negra não é o mesmo da mulher branca, etc.
Sendo assim, continuamos surdos para as desigualdades que o feminismo mostra. Continuamos não querendo enxergar outras facetas do que é ser mulher. Continuamos deixando várias mulheres na invisibilidade porque assim é mais confortável para nós, demanda menos lutas.

Considerando, no geral, todas as mulheres, sabemos que o quadro não é favorável. As brasileiras ganham cerca de 30% menos que os homens para as mesmas funções, têm que se preocupar com a gravidez no mercado de trabalho, o casamento ainda é visto como a máxima realização das mulheres, elas ainda são vistas como "o sexo frágil".
Estatísticas mostram que a Lei Maria da Penha não diminuiu a violência nem as mortes contra as mulheres. Entre os anos 2001 e 2011, em média, 5.664 mulheres morreram de forma violenta, 472 a cada mês, 15,52 a cada dia, de acordo com dados do IPEA.
E ainda há uma infinidade de problemas.

Agora, considerando no particular todas as facetas do que é ser mulher, a coisa fica pior.
As mulheres negras continuam sendo marginalizadas. Na faculdade onde estudo, por exemplo, quase todas as faxineiras são negras e terceirizadas. Ganham pouco e a invisibilidade se mostra quando se nota que quase ninguém as cumprimenta, quase ninguém as vê. É um sistema cruel, que as faz trabalhar limpando um lugar cujos bancos elas provavelmente nunca ocuparão.
Mulheres jovens (31%), negras (61%) e com baixa escolaridade (48%) foram as principais vítimas brasileiras dentre as mortes de mulheres no período de 2001 a 2011.

Em O Mito da Beleza, a escritora Naomi Wolf começa o livro falando em liberdade para falar dessa grande indústria que faz das mulheres prisioneiras de um ideal de beleza construído às custas de um negócio que lucra sobre a cirurgia plástica, revistas femininas, garotas anoréxicas, bulímicas, garotas sofrendo bullying, preconceitos, etc. Parece que é proibido à mulher envelhecer. As rugas são apagadas em photoshop e as garotas crescem achando que o que vêem nos comerciais é real, tentando atingir uma estética do plástico (das bonecas Barbie) que é impossível. Nas palavras da própria Naomi Wolf:
 "A eliminação dos sinais da idade dos rostos femininos tem a mesma ressonância política que seria provocada se todas as imagens de negros fossem costumeiramente clareadas. Essa atitude faria o mesmo julgamento de valor com relação aos negros que essa manipulação faz quanto ao valor da vida da mulher, ou seja, que menos vale mais. Eliminar os sinais de idade do rosto de uma mulher equivale a apagar a identidade, o poder e a história das mulheres."
Podemos incluir aí a mulher gorda. Em uma época em que o trabalho árduo era reservado às escravas, as mulheres gordas eram o ideal de beleza. Depois que as mulheres conquistaram o direito de estarem em qualquer tipo de trabalho, a coisa chegou a ponto de lojas recusarem trabalho a mulheres por serem gordas.

Entre os torcedores de futebol (mulheres incluídas), ainda se usa o termo "maria" como termo para diminuir o time adversário. Como se se identificar com características ditas "femininas" fosse demérito para alguém.
O orgulho do macho ainda é algo a se ultrapassar nesse meio. Por conta dele os homens se atacam por achar que o outro, muitas vezes seu semelhante, possui essas características ditas "femininas", gerando aí muitos problemas conhecidos como a famosa homofobia do futebol.

A mulher trans ainda luta por visibilidade. Ela só é lembrada sendo a prostituta ou em alguma polêmica envolvendo protestos para que ela não use o banheiro feminino. Aliás, protestos, em sua maioria, encabeçados por homens.
De acordo com dados do ANTRA - Associação Nacional de Travestis e Transexuais- 90% das travestis e transexuais estão se prostituindo no Brasil. Claro que isso se dá menos por opção do que por uma necessidade. São pessoas que geralmente saem de casa cedo porque a família não aceita sua identidade de gênero. Deixemos claro que identidade de gênero não tem nada a ver com orientação sexual. Classificar uma mulher trans como "gay" é o que mais se vê por aí.
O mercado de trabalho fecha as portas por puro preconceito, como se trans fosse sinônimo de menos capaz. Muitas abandonam a escola porque os professores não entendem que elas não devem ser tratadas por nomes masculinos. O constrangimento é enorme e o ambiente se torna insustentável.
A mulher trans ainda sofre violência e ainda tem que lidar com o silêncio e muitas vezes reprimenda da polícia, que deveria ser o órgão ao qual recorrer.
O facebook da Daniela Andrade está cheio de relatos sobre o que ela passou e ainda passa por ser mulher trans. Recomendo.

Ainda há muitas mulheres invisíveis que não cabem nesse texto e que ainda necessitam de uma voz e de espaço digno. Negras, velhas, gordas, indígenas, trans, muçulmanas, prostitutas, etc. Não importa qual, há um feminismo específico para todas elas que precisa ser ouvido. Temos que fazer nossa parte e lutarmos para trazer para o centro essas mulheres que estão marginalizadas pelo discurso. O feminismo é uma luta de protagonismo da mulher, mas é responsabilidade de todxs nós. Esse é o meu desejo para esse 8 de março.