quinta-feira, 24 de julho de 2014

International Drag Day -um papo sobre Rupaul's Drag Race

Rupaul

Dia 16 foi o International Drag Day, ou o Dia Internacional de Drag. O termo drag possui amplo significado, mas aqui vamos ficar com o que faz referência à mudança na própria aparência para brincar com o gênero, tendo o objetivo de entreter. Há vário tipos de drag.

Drag queen - homem se apresentando como mulher
Drag king    - mulher se apresentando como homem
Faux queen - mulher se apresentando como drag queen
Faux king    - homem se apresentando como drag king

Lady Gaga como Jo Calderone

Drag sempre está relacionado ao exagero. Não é apenas personificar, se não seria um impersonator. Fazer drag é pegar os detalhes e exagerá-los, às vezes ao máximo. A cantora Lady Gaga é um ótimo exemplo. Suas apresentações como Jo Calderone são hilárias. Não há dúvidas de que o papel que se representa acaba virando uma persona. Quem faz drag é capaz de descrever até a personalidade do seu personagem.

Assim, nada melhor do que falar de Rupaul's Drag Race no Drag Day. O programa é um reality show de drag queens, em que se pode ver a arte que há por trás da coisa em meio a muitas risadas.

Laganja Estranja -6ª temporada

Mais do que simplesmente emular um gênero para a audiência, o que se faz ali é um ato político travestido de muito humor (desculpa, não resisti o jogo de palavras rsrs). Tem de ficar atento para não perder as sutilezas. As melhores se revelam na linguagem. Fica claro o esforço que tem a equipe do programa para montar uma linguagem que diverte e é ao mesmo tempo engajada.

Para falar da linguagem, quero lembrar Madonna, em seu discurso no Amnesty International's Bringing Human Rights Home concert, em fevereiro desse ano, que agradeceu às meninas da banda Pussy Riot por tornar a palavra pussy (vagina) uma palavra dizível dentro de casa. Antes, era uma palavra "ilegal", e agora as crianças dizem pussy o tempo todo, continua ela. Madonna e as Pussy Riot mostraram como uma palavra, usada em um diferente contexto, pode chamar a atenção para o preconceito. Porque muitas vezes o preconceito se mostra na semântica. Assim acontece em Rupaul. (a referência a Madonna aqui também é proposital. outra sutileza rsrs). Veremos:

Já que a maioria do preconceito nesse universo tem origem na misoginia -as drags são execradas por emular 'o outro sexo'- vamos começar por bitch, palavra que no inglês é largamente usada para ultrajar mulheres, no programa é usada de forma muito amigável. É quase como o nosso 'colega'. Latrice Royale, participante da 4ª temporada, nos dá uma nova significação para o termo:


Bitch - Being In Total Control Of Herself (estar em total controle de si mesma)

 De acordo com Rupaul, a drag que quiser vencer a competição deve ter charisma, uniqueness, nerve and talent (carisma, singularidade. resistência e talento). Juntando as iniciais, temos cunt, uma palavra que também significa vagina e é extremamente ofensiva quando usada para se referir a mulheres. De forma bem sutil, cunt virou uma qualidade que leva à vitória.

Durante o programa, os participantes contam como a infância foi difícil. Histórias horríveis, tendo até pai e filho que foram parar no hospital depois de uma briga envolvendo facas. Esses meninos crescem ouvindo adjetivos degradantes, como sissy, bitch, cunt, pussy, fag. É dito para eles que eles não têm colhões (you don't have balls to do this or that). Testículos viram sinônimo de masculinidade em uma relação metonímica que, por mais que eu tente entender, me escapa. Isso nos leva ao famoso "sissy that walk!" que Rupaul diz toda vez em que as drag race vão pra passarela apresentar suas criações.

Rupaul
É um jeito de dizer ao outro para não mais usar tais termos como ofensas, no melhor estilo Slut Walk, que chegou ao Brasil como a Marcha das Vadias.

Agora, fugindo um pouco ao tema da linguagem, o peso das participantes é um assunto a ser explorado. O que nos vem à mente quando pensamos no programa é 'beleza'. Não é segredo para ninguém que o padrão de beleza atual é o corpo magro. A gordura não é bem vista por muitos. Quando analisamos programas como America's Next Top Model, é de espantar que eles considerem garotas como Whtiney Thompson uma modelo plus size.


Whtiney Thompson


O que para mim é uma garota normal, para eles é plus size. Por aí pode se ter uma idéia de como andam os padrões de magreza beleza na moda. Em Rupaul, as big girls competem normalmente com as outras garotas. Porque assim deve ser. Tanto dentro do programa quanto fora dele. E lá, plus size é realmente plus size.

Darianne Lake, participante da 6ª temporada

Entre gordos, magros, latinos, brancos, negros e tantos outros, meu texto não esgota todos os assuntos que há para se falar. Mas espero ter explicado bem a importância do programa. É muito interessante vermos homens fragilizados que buscaram força para prosseguir em uma figura "feminina", se é que essa categoria ainda existe. Enquanto não temos um mundo com mais isonomia, programas como esse lutam como podem, "batendo de frente" e mandando um recado:

Raven, participante da 2ª temporada